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Entrevista ao ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Matos Fernandes. Lisboa, 12 de janeiro de 2022. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR
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João Pedro Matos Fernandes, ministro do Ambiente, está há seis anos com a pasta

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

João Pedro Matos Fernandes, ministro do Ambiente, está há seis anos com a pasta

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Matos Fernandes: "Portugal ouve Espanha. Infelizmente nem sempre acontece o contrário"

Portugal pediu um parecer a Espanha sobre a exploração de lítio no Barroso. Mas nem sempre Espanha faz o mesmo em projetos transfronteiriços, diz em entrevista o ministro do Ambiente, Matos Fernandes.

Como faz questão de salientar esteve seis anos com a pasta do Ambiente, batendo todos os recordes. João Pedro Matos Fernandes, ministro do Ambiente e da Ação Climática, faz um balanço, admitindo, no entanto, que tinha preparado quatro anos de legislatura. Não antecipa se ficará no Governo caso o PS saia vencedor nas eleições de 30 de janeiro. Apesar de ser um ministro “muito realizado”, assume que há muitíssima coisa para fazer.

Apesar de o Bloco ter sido criticado por várias vezes nesta entrevista ao Observador, Matos Fernandes olha para a esquerda quando se pede para escolher um parceiro para o PS, caso seja necessário. Não tem dúvidas de que o PSD “não será, nunca, na minha opinião um primeiro parceiro para conversar”.

O Ministério do Ambiente passou a ser um megaministério — que gere um megafundo de mil milhões — e, por isso, tem muitos dossiês em mãos. Mas “há quem não possa ver um chapéu a um pobre”.

João Pedro Matos Fernandes defende Bruxelas a discussão de um novo modelo de fixação dos preços grossistas da eletricidade para travar impacto do gás natural caro, mas que não ponha em causa a expansão das renováveis. E revela que em março já haverá energia a sair da barragem do Alto Tâmega. O atraso nesta obra e numa ligação a sul, garante, não faz temer pela segurança da rede de eletricidade.

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Ao Observador refere, ainda, que o projeto da mina de lítio no Barroso aguarda um parecer pedido pela APA (Agência Portuguesa do Ambiente) a Espanha sobre impactos transfronteiriços. E é a propósito deste pedido não vinculativo que Matos Fernandes realça a falta de reciprocidade que acontece por vezes de Espanha para com Portugal. “Portugal ouve Espanha. Infelizmente nem sempre acontece o contrário”.

Mas é com Espanha que também tem de falar sobre os caudais do Rio Tejo. A expansão da área de regadio, num quadro de redução da chuva que cai abaixo do Tejo, preocupa o ministro do Ambiente, apesar de considerar que no Alqueva ainda há margem para mais, desde que com maior eficiência na utilização da água.

Andamos a ouvir há anos que as renováveis vão baixar o preço da eletricidade. Mas isso não está a acontecer. Até quando pode o Governo, ou um futuro Governo, aguentar esta escalada e impedir aumentos significativos para famílias e empresas?
Não  sei de que aumentos está a falar. As renováveis já estão a fazer baixar o preço da eletricidade.

Estou a falar do preço do mercado grossista que é onde se abastecem as elétricas.
O preço do mercado grossista é marcado pela tecnologia de menor eficiência que é o gás, mas as pessoas não pagam esse preço, pagam a fatura da luz que lhes chega a casa e que, no mercado regulado no final do mês janeiro – se consumirem o mesmo –, vão receber uma fatura que é 3,4% mais baixa. Em Espanha o aumento de eletricidade foi de 34% num tempo em que diz, e bem, o mercado grossista subiu muito o preço. Se me perguntar porque conseguimos conter o preço da eletricidade foi precisamente pela grande aposta que fizemos nas renováveis, porque 60% da eletricidade que consumimos em Portugal tem origem em fontes renováveis. Colocámos 815 milhões naquilo que chamei de almofadas para conter o preço da eletricidade, mas em bom rigor 250 milhões não foram lá postos. Já lá estavam e são o sobreganho do que, no passado, foi um sobrecusto quando comparamos o preço das tarifas fixas com o preço do mercado. Todas as tarifas fixas que vêm de trás, e que eram altas quando o mercado grossista estava baixo, são hoje muito mais baixas do que o preço de mercado.

A pergunta tinha a ver com a evolução futura do preço da eletricidade, a partir do próximo ano.
A tendência será sempre essa. É a eletricidade mais barata que se pode produzir e com impacto zero na balança comercial porque toda energia fóssil obriga a importações. O fim do carvão já levou a uma poupança de 440 milhões de euros nos últimos quatro anos. É mesmo a partir de fontes renováveis que a eletricidade pode ser produzida mais barata e que a eletricidade para os portugueses vai ser mais barata num futuro que está cada vez mais próximo.

Em janeiro a tarifa desceu face a dezembro, mas ao longo do ano a tarifa regulada teve dois aumentos extraordinários. Não há nada que garanta que isso não vá acontecer este ano….
Não há nada que garanta que isso vá acontecer este ano. Todo o preço da energia em Portugal aumentou 14%, quando compara com 36% em Espanha e com mais de 80% na Noruega e de todos os países da OCDE. Sim, estamos no meio de uma crise energética e isso é inegável. O preço do gás é fixado pelos mercados internacionais e é este preço que fixa em Portugal uma parte significativa da energia, sobretudo quando não há chuva e quando não há sol, não há vento. Mas o que interessa às pessoas é o que elas pagam e essa fatura desce no mercado regulado. E de todos os três grandes comercializadores só um disse que ia ter de aumentar a tarifa. As pessoas podem mudar de comercializador e podem voltar ao mercado regulado. Não estou com isto a dar a conselhos, mas as pessoas têm de estar atentas.

Alguns países têm defendido junto da Comissão Europeia a revisão das regras do mercado grossista para que não seja a tecnologia mais cara a fixar o preço de toda a energia. Qual é a posição de Portugal?
É de total abertura a essa revisão. Eu percebo o mercado marginalista e a forma como os preços são fixados, vêm de um tempo em que a produção renovável rondava os 20%. Agora estamos nos 60% e faz todo o sentido ter um novo olhar sobre a forma como se fixam os preços. Mas isto tem de ser feito com muito juízo. Os espanhóis quiseram fazê-lo de forma razoavelmente ad hoc e aquilo que aconteceu foi que a produção de renováveis baixou imenso nos últimos meses do ano e levaram com um aumento tarifário na casa dos 30%.

Em que prazo pode acontecer essa revisão?
Tem de ser feito de forma muito ponderada, mas creio que é um trabalho que pode ser executado e a feita a cenarização em não menos do que um ano e tem de ser sempre feito um balanço sobre o risco para os contratos de renováveis em cima da mesa. Porque se essa alteração de preço levar a um desinvestimento nas renováveis, isso será um erro no médio e longo prazo. É um erro do ponto de vista ambiental, como pode ser um erro do ponto de vista económico, porque não é nada certo que os preços venham a baixar por essa intervenção. Agora estamos completamente abertos a que esse trabalho seja feito. Isso sim.

"Faz todo o sentido ter um novo olhar sobre a forma como se fixam os preços. (...) Tem de ser feito de forma muito ponderada, porque se essa alteração de preço levar a um desinvestimento nas renováveis, isso será um erro no médio e longo prazo. É um erro do ponto de vista ambiental, como pode ser um erro do ponto de vista económico, porque não é nada certo que os preços venham a baixar por essa intervenção."
João Pedro Matos Fernandes, ministro do Ambiente e da Ação Climática

Ligações atrasadas não comprometem abastecimento elétrico, garante Matos Fernandes

Portugal é apontado como pioneiro nas renováveis e em particular quando terminou a produção de carvão, mas há pressupostos dessa decisão que ainda não se concretizaram. As barragens do Alto Tâmega não estão a produzir e há pontos de ligação à rede por fazer no solar. Estes atrasos podem pôr em causa a segurança de abastecimento?
Não põem, porque tomámos decisões para que assim não fosse. Mais do que as centrais solares, que têm entrado paulatinamente em funcionamento, no prazo, era a existência de uma ligação de alta tensão entre Ferreira do Alentejo e Tavira. Não só para garantir o abastecimento do Algarve, mas para absorver a eletricidade na região onde estão a ser instalados muitos parques solares. É verdade que há um atraso nesta ligação, é verdade que há um atraso no Alto Tâmega, mas também é verdade que dentro de um mês alguns dos grupos vão começar a produzir eletricidade para o mercado. Estimamos que em março já seja sensível no novo equilíbrio da rede. Temos de forma absolutamente equilibrada o sistema elétrico nacional que é de facto muito robusto. Portugal e Espanha produzem mais do que a eletricidade necessária. Importávamos alguma energia de França exclusivamente por razões económicas. França tem um grande aparelho de produção nuclear (que está parcialmente desligado) e que produz ao fim de semana praticamente a custo zero porque não pode ser descontinuado. Às vezes ao fim de semana importamos eletricidade de França, mas era para a ter mais barata, nunca por necessidade dessa eletricidade.

O que pode acontecer é termos de importar mais eletricidade?
Dificilmente o podemos fazer. França é, aliás, hoje um grande importador de eletricidade, porque está a fazer grandes manutenções nas centrais nucleares.

Quando importamos energia de Espanha, também estamos a importar energia produzida a carvão. Como se justifica isto com o fim do carvão em Portugal?
Toda a eletricidade que era produzida a carvão em Portugal era toda ela importada e era 100% a carvão. Se importarmos eletricidade é de um mix em que o carvão representa cerca de 10% a 11%. É trocar 100% por 10 ou 12%.

A pandemia levou ao adiamento de alguns prazos para concluir o licenciamento das centrais solares adjudicadas em 2019. Quando é que essas centrais vão começar a produzir?
Alguma estão muito próximos de começar a produzir,. Das 26 licenciadas, salvo erro, 16 já estão em produção. Não vou dizer que não há atrasos, mas são de pouquíssimos meses. Além da crise da energia, há em paralelo uma crise de matérias primas, e há um conjunto de projetos solares parados na Europa porque os painéis estão mais caros e em Portugal conseguimos que isso não acontecesse. Não vou negar que há um atraso de dois meses aqui ou três meses ali. Mas há outros que não estão nada atrasados. E se fizermos o calendário ao ano, não regista atrasos.

Carregamentos elétricos vão ser subsidiados

Getty Images/iStockphoto

Incentivos para compra de carros elétricos só depois de Orçamento aprovado

O Governo tinha a intenção de aumentar os incentivos para a compra de carros elétricos para 10 milhões. Quando vão aprová-los?
No contexto do próximo Orçamento.

Era uma coisa que podiam fazer sem Orçamento do Estado….
O dinheiro para o apoio a veículos elétricos para famílias e empresas é atribuído no contexto do Fundo Ambiental. Vou fazer um despacho nos próximos dias, mas só para despesas correntes como o pagamento a sapadores. Esse despacho [dos incentivos] vai ficar para o próximo governo.

Assinou o despacho para o Fundo Ambiental financiar os carregamentos elétricos e já havia eleições marcadas.
Estávamos em 2021 e com dinheiro de 2021.

Mas foi já em 2022.
Foi com uma sobra do Fundo Ambiental. Em bom rigor devia ter sido apenas após o Orçamento do Estado.

Mas é o Fundo Ambiental que vai financiar os carregamentos elétricos?
O Fundo já financiava com 350 mil euros a tarifa de acesso à rede. Mas esta tarifa teve uma redução de 94%, por isso, não fazia sentido colocar aí esse dinheiro. Por isso, a ERSE de forma completamente independente cuidou por bem e por razões de justiça cobrar uma taxa que iria onerar os carregamentos. E foi para contrariar, anular esse aumento que se decidiu que o dinheiro que se colocava nas tarifas de acesso à rede fosse usado para garantir que não há aumento por via administrativa do preço dos carregamentos na via pública, cuja rede tem crescimento exponencialmente.

Essa decisão de contrariar a ERSE não é tirar o tapete à ERSE e ir contra a decisão de um regulador?
Ora essa, o regulador resolveu que ia ser cobrada uma taxa com total independência. Essa taxa iria contra a política do Governo que é de promover a mobilidade elétrica, porque temos de reduzir em 49% as emissões até 2030, entendemos por bem compensar essa decisão do regulador. O regulador toma as suas opções e não nos pede licença para nada, mas eu também não peço licença ao regulador para tomar opções políticas.

"O regulador [a ERSE] toma as suas opções e não nos pede licença para nada, mas eu também não peço licença ao regulador para tomar opções políticas."
João Pedro Matos Fernandes, ministro do Ambiente e da Ação Climática

O orçamento do Fundo Ambiental já vale mil milhões de euros por ano. O Parlamento devia ter um escrutínio acrescido sobre a forma como o dinheiro é gasto?
Porque não faz essa pergunta em relação ao Orçamento do Estado que tem um valor muito maior?

O Parlamento escrutina muito o Orçamento do Estado.
As contas do Fundo Ambiental fazem parte do Orçamento do Estado. Todas as despesas são precedidas de um despacho que sai em Diário da República. Basta ir ao site. Houve de facto uma enorme inveja, não consigo usar palavra diferente, em relação à criação do Fundo Ambiental. Quando eram quatro fundos geridos pelo PSD/CDS eram 180 milhões de receitas, hoje são mil milhões. Os 180 milhões tinham uma taxa de execução de 60% e custavam quatro milhões a gerir. Este era o mundo que, pelos vistos, a direita gosta. Nós com um milhão de euros que é quanto custa a gestão (depois da fusão dos quatro fundos) temos mil milhões de receita e aplicamos 98% do dinheiro.

O Fundo Ambiental só não é mais escrutinado porque o Parlamento não quer?
Não é isso. As despesas são públicas. Eu de facto já ouvi coisas extraordinárias sobre o Fundo Ambiental, nomeadamente os ambientalistas a dizer que devia ser gerido pelo Ministério das Finanças. Isto é mesmo de quem não sabe porque é que a bola pincha. Não sei dizer isto de outra forma. Há este sentimento de não se poder ver um chapéu a um pobre. O Ministério do Ambiente é hoje um ministério com enorme capacidade de investimento e apoio a projetos que estariam perdidos se não houvesse este fundo.

Não há o risco de se estar a meter demasiadas coisas no Fundo Ambiental, da eletricidade aos transportes públicos. O que acontece se houver uma descida brusca nos preços das licenças de CO2 que são a maior receita?
Se isso acontecer em tese, e não vai acontecer, o Fundo Ambiental é uma parte do Orçamento do Estado e portanto o que é a comparticipação na expansão das obras dos Metros de Lisboa e Porto seria normalmente financiada pelas despesas gerais do Estado e é isso que voltará a acontecer se o Fundo Ambiental perder essa receita. Agora não há qualquer razão para achar que o preço do carbono vá descer nos próximos anos. No ano passado chegou aos 80 euros por tonelada e quando foi o acordo de Paris estava nos nove euros.

Existem ainda muitos subsídios perversos, mas gasóleo profissional não acaba

Nos últimos anos estamos a ver a transição energética a acelerar. Esta situação levará o Estado a perder receitas fiscais muito importante nos combustíveis e automóveis. A longo prazo terá de compensar esta perda de receita. Vão ter de cair os apoios à eletricidade?
O que tem de cair em primeiro lugar é o valor dos apoios dados aos combustíveis fósseis. Ainda hoje temos incentivos perversos de 400 a 500 milhões de euros.

Está a referir-se ao quê?
A eletricidade produzida a partir do carvão que pagava zero por cento do ISP e quando chegou a 50% (do imposto) a central de Sines fechou. Existem ainda muitos subsídios perversos que o Estado tem vindo a combater.

O gasóleo profissional é um subsídio perverso?
Em tese é um subsídio perverso, mas percebemos a sua razão, que tem a ver com não haver um desequilíbrio de preços entre Portugal e Espanha, e, por isso, é absolutamente essencial que apareçam veículos pesados movidos a hidrogénio porque esses não terão de pagar qualquer taxa de carbono porque se trata de um gás renovável.

PEDRO SARMENTO COSTA/LUSA

Portugal pediu parecer a Espanha sobre lítio do Barroso. Parecer não é vinculativo

Nos últimos dias do ano passado, o Parlamento aprovou alterações significativas à regulamentação da lei de bases do setor mineiro. O seu secretário de Estado Adjunto João Galamba chegou a chamar a atenção no Parlamento para terem cuidado com as alterações porque poderiam por em causa alguns projetos de exploração. As alterações que o Parlamento impôs podem efetivamente por em causa a futura exploração mineira?
A dada altura houve propostas — penso que foi do Bloco mas pode ter sido do PEV, peço perdão não sei — de se ir atrás, a contratos já assinados, e era isso que nos preocupava particularmente, e foi a isso a que João Galamba se referiu. E essa alteração não foi votada. Mas aquilo que foi votado é um absurdo. E o absurdo não é não haver exploração mineira nas áreas protegidas — aí, de facto, não me peça para ser a favor de haver exploração mineira nas áreas protegidas, não sou a favor — só que não é aqui [na lei das minas] que ela se decide. É nas regras das áreas protegidas que essas coisas têm de ser decididas. Por exemplo, o regulamento do parque nacional da Peneda-Gerês diz que é proibida a existência de minas. Muito bem. Aquilo que nós defendemos foi mesmo uma formalidade. É um absurdo que numa lei das minas isto seja dito. Tem é de ser dito nos instrumentos de gestão dos diversos espaços territoriais, dos diversos espaços protegidos. Aquilo que eu discordo completamente, e acho que é de facto uma bizantinice, é aproveitar a lei das minas para fazer esta proibição territorial, não tem na minha opinião qualquer sentido ela estar aqui.

Acha que vai ser mais difícil conseguir contratos de exploração mineira, nomeadamente no lítio, que foi um dos grandes alvos?
De todo. Pelo menos no concurso que este Governo quer lançar, e que estimo que o próximo Governo lance, já tinham sido excluídos três sítios que estavam em grande parte em áreas protegidas. Depois, quando foi lançada a avaliação ambiental estratégica, nós próprios excluímos todos os sítios da Rede Natura 2000, que, em bom rigor, em termos de significado territorial, só o tem na Serra de Arga. Aqui, objetivamente, no sítio onde o LNEG disse haver um potencial de lítio grande foi reduzido para menos de metade ou retirada do espaço da Rede Natura 2000.

O projeto da Savannah vai conseguir autorização ambiental para avançar?
Essa é uma questão concreta sobre a qual não me pronuncio. E não tem nada a ver com lei alguma. Está a ser feita a avaliação de impacte ambiental conduzida pela APA. Sei dizer qual é o ponto de situação. Foram identificados potenciais impactos transfronteiriços, foi pedido o parecer a Espanha, e aguarda a APA o parecer vindo de Espanha para depois poder tomar uma decisão.

Que impactos transfronteiriços? Do que é que estamos a falar concretamente?
É uma localização próxima da fronteira e, por isso, é absolutamente normal,  sempre que existe um projeto próximo da fronteira, Portugal ouve Espanha. Infelizmente nem sempre acontece o contrário, mas nós fazemos sempre bem o nosso trabalho.

Espanha vai dar um parecer?
As autoridades darão um parecer que não é vinculativo, mas que naturalmente há que ser considerado e leremos com o maior cuidado esse mesmo parecer. Recordo é que às vezes saem notícias, infelizmente verdadeiras, a dizer que em Espanha há o projeto A ou o projeto B e Portugal não é ouvido. Nós não fazemos assim.

E no caso da Lusorecursos?
Foi decretada a conformidade do estudo de impacte ambiental, isso não quer dizer nada do ponto de vista do seu mérito, quer dizer que o estudo de impacte ambiental que foi entregue tem condições para poder ter uma apreciação por parte da administração e portanto seguirá naturalmente a sua avaliação. Repito. Estes dois projetos têm licenças e autorizações anteriores a esta lei das minas, e se houve de facto uma vontade de andar para trás no tempo, às vezes acontecem estes disparates, para que também eles viessem a ser afetados, vingou o bom senso e não se andou para trás no tempo, e portanto eles serão apreciados, sendo que numa avaliação de impacte ambiental prévia se for positiva permitirá o avanço das minas, naturalmente com as restrições que resultem da avaliação de impacte ambiental.

Faz sentido explorar o recurso mineiro de lítio em Portugal sem a garantia de uma unidade de processamento industrial?
Essa garantia é absolutamente essencial. Temos um processo de projeto industrial muito fundado naquilo que é a exploração dos mais importantes recursos minerais que temos e que são importantes para a nova economia, isto é uma economia descarbonizada e digitalizada. E um deles é evidentemente o lítio. Basta ver aquilo que são as propostas, as candidaturas das agendas para a mobilização da indústria e há dois grandes consórcios que querem construir uma refinaria em Portugal.

Um deles vai ter de ficar pelo caminho ou não?
Não sei se um deles vai ter de ficar pelo caminho. Para haver refinação de lítio em Portugal — e quem diz refinação diz depois a produção de cátodos, a produção de células, a produção de baterias, e a reciclagem dessas mesmas baterias — vai ter de haver importação de lítio. Não há nenhuma refinaria de lítio na Europa, é de facto um projeto inovador no contexto europeu, que queremos muito que se localize em Portugal e que não seja só a refinação do lítio, pelo menos para os cátodos e para as células, Portugal tem todas as condições e a parcela maior da cadeia de valor do lítio às baterias está exatamente aqui. A fábrica das baterias tem uma simbologia muito própria, mas não é mais do que uma fábrica de assemblagem. Onde existe tecnologia inovadora não é no juntar das células com o plástico para fazer a bateria, é na fabricação dessas células e na refinação do próprio lítio e é essa a nossa grande aposta e ficámos muito satisfeitos por termos visto nas agendas essas mesmas duas candidaturas.

Um dos projetos que mobiliza mais milhões, pelo menos no papel, é o hidrogénio verde. Mas a sensação que temos é que há muitos anúncios e intenções, mas as coisas têm demorado a sair do papel e a concretizar-se. O que falta para que estes projetos, nomeadamente em Sines, comecem a avançar efetivamente com investimentos no terreno?
Os projetos estão a avançar com a certeza que até haver produção de hidrogénio verde tempo passará e nunca nenhum de nós disse que achava que ia haver produção de hidrogénio verde em Portugal antes do final de 2022. Relativamente aos 40 milhões de euros de fundos comunitários mobilizados pelo POSEUR penso que estaremos a dias de saber quais foram os projetos aprovados. Houve mais procura que oferta. Do aviso que foi lançado para o hidrogénio verde no contexto do PRR, tomei hoje de manhã [quinta-feira] a decisão de permitir que se vá além dos cerca de 80 milhões de euros que estão no aviso. Existe a linha de cerca de 186 milhões de euros, e o aviso que foi lançado tem uma parte deles – 70 a 80 milhões –, mas a procura é tanta que dei autorização para poder alargar essas mesmas possibilidades de apoio.

Para quanto?
Não fixei o valor. Se as candidaturas tiverem mérito acima do valor que está no aviso pode o júri aprovar mais candidaturas do que o dinheiro que do aviso, sem nunca ultrapassar os 186 milhões, também não iremos tão longe neste primeiro aviso. E, portanto, todas elas estão a mexer. Sei de fábricas para produzir eletrolisadores que estão em reconversão, porque são unidades industriais já existentes. E há projetos maiores concentrados em Sines. Onde o projeto inicial transformou-se em três. Manteve-se o consórcio inicial para a parte da inovação e investigação — obtiveram 30 milhões de euros diretamente a partir de Bruxelas. Sabemos que a Galp saiu para fazer ela própria um projeto, para produzir 1 GW de hidrogénio verde até ao final de 2030, porque isso é essencial para a própria refinaria; e sabemos que o projeto da EDP é em conjunto com a Repsol. Ou seja, tudo isto está a mexer com a certeza de que a maior parte destas unidades tem de ter um projeto, um estudo de impacte ambiental, uma obra, e portanto essas coisas não acontecem do pé para a mão, mas a dinâmica é maior do que era no início e há coisas que vamos aprendendo com o tempo.

O que é que aprendemos já neste momento?
O que aprendemos com o tempo é o espantoso interesse que a indústria tem, nomeadamente a química e a metalomecânica, em ser cliente do hidrogénio. O hidrogénio que estimamos que venha a ser produzido em Portugal até 2030 tem todo ele já comprador industrial, ou seja, a probabilidade de injetar hidrogénio na rede, que até já há uma experiência em concreto no Seixal a ser feita, só vai acontecer se a nossa produção de hidrogénio crescer muito mais, porque para a descarbonização da indústria o hidrogénio verde é absolutamente chave.

A exportação não está para já no horizonte?
Mantém-se em cima da mesa e o consórcio original de Sines do qual saíram a EDP e a Galp mantém esse projeto, e acho que é muito importante que o mantenha. Mas é também verdade que parece haver clientes internos para todo esse hidrogénio verde que venha a ser produzido.

Quando chegou à pasta da energia as relações entre o Governo e a EDP eram no mínimo tensas, como é que evoluiu esse relacionamento?
São relações absolutamente normais. Eu tenho por hábito ter relações normais e não ter relações tensas no trabalho. E, portanto, tenho uma relação institucional, normalíssima, com a EDP, como tenho com a Galp, como tenho com a REN, como tenho com muitas outras empresas.

Tem defendido que é muito importante que estas grandes transições sejam feitas com as empresas de energia e não contra as empresas de energia.
É absolutamente essencial. No caso da EDP foi mais simples, já era ela uma empresa muito voltada para as renováveis quando assumimos esta pasta. No caso da Galp não digo o mesmo. Recordo bem a primeira conversa — que não revelarei com detalhe – com os acionistas da Galp e com a sua administração que se dizia do oil & gas e que hoje se diz da energia. É absolutamente essencial — independentemente de quem é o dono do capital, são marcas portuguesas, percebidas como portuguesas no mundo, com uma grande capacidade técnica e com capacidade de investimento — arregimentar a EDP e a Galp para a transição energética que o país precisa e que está a ter.

GALP
"Recordo bem a primeira conversa -- que não revelarei com detalhe - com os acionistas da Galp e com a sua administração que se dizia do oil & gas e que hoje se diz da energia." MATOS FERNANDES
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Em relação à EDP houve as críticas de que houve algum favorecimento à EDP no caso da venda das barragens. Acha que podia ter feito a gestão deste dossiê de forma diferente?
Eu sei que há críticas ao favorecimento, não sei é onde é que esteve e onde é que está o favorecimento. Quando uma grande empresa da energia como a Engie aparece a querer comprar seis barragens à EDP, achei uma ótima ideia. Achei, e acho. Acho que reduzir o monopólio da EDP, que foi criticado durante anos e anos, era mesmo importante. Portanto não houve aqui nenhum veto à partida a essa venda. Aquilo que o Ministério do Ambiente, através da APA, teve de fazer foi uma análise sobre duas questões: primeiro tem o comprador idoneidade financeira e técnica para o poder fazer — e concluiu que sim, e acho que é muito fácil perceber porque é que concluiu que sim. E depois teve de se debruçar sobre um conjunto de questões, como seja a gestão dos recursos hídricos e os caudais ecológicos naquela zona. Por exemplo, a barragem do Tua — que é uma das que foi vendida — tem a jusante a barragem da Régua que continua a ser da EDP, portanto foi preciso fazer todo esse novo desenho da disponibilidade hídrica que existia para cada barragem. Uma vez feita não havia nenhuma razão para dizer não à luz da lei. E continuo a dizer que é mesmo importante que apareça um novo player do mercado, com a robustez, a dimensão e a capacidade técnica e financeira que a Engie tem.

"Quando uma grande empresa da energia como a Engie quer comprar seis barragens à EDP, achei uma ótima ideia. Achei, e acho. Reduzir o monopólio da EDP era mesmo importante." MATOS FERNANDES
ANTÓNIO COTRIM/LUSA

As críticas foram por causa do não pagamento de imposto de selo.
O Ministério do Ambiente não manda em imposto algum. O imposto de selo, por definição, é pago depois de um determinado contrato de compra e venda, seja ele uma barragem, seja o que for. E só na data para esse mesmo pagamento de imposto de selo se percebeu que a EDP entendeu que não tinha de o pagar. Está a Autoridade Tributária a avaliar se tem ou não de o pagar.

O senhor ministro chegou a dizer publicamente que não havia lugar a pagamento de imposto.
Não diga isso. Não foi isso que eu disse.

Então o que é que disse?
Eu sei muito bem o que disse. Eu disse que não havia lugar ao pagamento de IMI, eu disse que não havia lugar ao pagamento de IMT e à parcela do imposto de selo que lhe está associado, os 0,8%. Depois da venda do negócio da produção de eletricidade das barragens, foi criado um grupo de trabalho para promover um conjunto de investimentos naqueles mesmos territórios, ao qual pertenceu a Autoridade Tributária (AT), portanto não era um grupo de consultores, e a AT nesse relatório escreveu, era esse o seu entendimento há seis meses, que não havia lugar ao pagamento de IMI, nem de IMT, porque [as barragens] são bens públicos. E foi só isso que eu disse. Sobre haver ou não pagamento de imposto de selo no negócio propriamente dito, isso tem a ver com a forma do negócio e sobre ela nem o Ministério do Ambiente se pronunciou nem eu tenho conhecimento para saber pronunciar-me.

Nem tem conhecimento de que haja decisão das finanças em relação a essa questão
Rigorosamente nenhum. Eu quase que me apetece dizer que não há, se houvesse já saberíamos. Estou curioso.

Também deverá estar curioso com um dos processos da EDP, que deverá estar uma decisão para breve no tribunal arbitral, que tem a ver com a barragem do Fridão. Tem alguma informação sobre este processo?
Nenhuma. A única informação é que prestei depoimento como parte nesse mesmo tribunal arbitral. Continuo a dizer que o melhor negócio que a EDP podia fazer era não fazer a barragem. [A EDP] escreveu isso em duas cartas e portanto não havia meios termos do contrato. Se o Estado decidir que não deve fazer tem de devolver à EDP o pagamento de 200 e tal milhões de euros. Se a EDP não quiser fazer prescinde de. Na minha opinião é absolutamente claro que a EDP me escreveu por duas vezes a dizer que não queria fazer.

Está completamente convencido que o tribunal arbitral vai dar razão ao Estado?
Eu sou filho de um juiz e portanto a única coisa que se pode esperar da decisão do juiz é nunca saber o que é que ela vai ser. Nós somos uma parte e como parte estamos profundamente convencidos que temos razão, de outra forma não teríamos feito assim. O tribunal arbitral decidirá.

Se perder no tribunal arbitral admite ir para o administrativo?
Não é possível. Dizem-me que o contrato não o permite.

Rio Tejo teve anos com pouca água

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Tejo é preocupação para Ministério do Ambiente

Na primeira legislatura enfrentou uma situação de seca muito grave com grandes consequências ambientais no rio Tejo. Com a repetição de episódios de seca, faz sentido repensar a existência de indústrias ao longo do rio que usam e aproveitam a água, mas que em circunstâncias de insuficiência de recursos hídricos não têm condições para funcionar como a indústria das celuloses?
As regras já foram mudadas, e bem mudadas. A partir do momento em que foram mudadas tem corrido bem. Durante muitos anos, quando eu era só um técnico destas áreas, ouvi falar muitas vezes na necessidade das licenças de rejeição de efluentes estarem associadas à disponibilidade hídrica. Mas isso nunca foi feito. Há 20 anos todos sabiam como é que devia ser, mas nunca fizeram nada. Aquilo que fizemos foi mesmo isso. O volume de rejeição de efluentes, que está sempre indexado à capacidade de captação, passou no Tejo — e estamos agora a fazer essa experiência noutros rios — a existir prevendo uma época húmida e uma época seca e prevendo-se para casos evidentes de seca uma maior redução desses mesmos valores. Portanto isso está assegurado. Mormente, o rio que mais preocupações nos causa que é o Tejo.

Por causa do Tejo houve reuniões com Espanha, nomeadamente este verão, por causa da  definição de caudais. O que aconteceu nessas reuniões? A gestão ficou acertada? Houve acordo?
A Convenção de Albufeira fixa três valores. Um volume anual de transferência de água, um volume trimestral e um volume semanal. E aquilo que percebemos é que ao fim de três trimestres Espanha já tinha transferido a água toda para um ano.

Mas era permitido?
Absolutamente. Quando não tem capacidade de a reter até é obrigado fisicamente a fazê-la transpor. E aquilo que aconteceu foi isso. Nós corremos de facto um risco durante este último verão de termos muito pouca água no Tejo, e houve alguns dias em que isso aconteceu, mas de uma maneira geral isso foi muito mitigado por essas mesmas reuniões, porque antecipámos — isso também nunca tinha sido feito… estamos sempre a aprender.

Tem de ser feito ano a ano?
Ano a ano isso tem de ser feito. Quando se fala de água o ano acaba em outubro e portanto quando chegamos ao início de julho e se virmos que já foi transferida muita água é fundamental falar com Espanha para garantir que não há quase que um corte, embora haja mínimos semanais e mínimos trimestrais. Mas o mínimo trimestral é muito menos do que aquilo que Portugal necessita.

Enquanto ministro do ambiente estará preocupado com os recursos hídricos em Portugal. Como é que olha para o crescimento da área de regadio?
Com preocupação. E todos os projetos do regadio têm de ser sobretudo projetos que invistam na eficiência hídrica, isto é, até podem expandir mas têm de garantir uma muito menor utilização de metros cúbicos de água por hectare e uma muito menor perda de água no próprio solo. É isso que estamos a fazer em concreto no Algarve. Dos 200 milhões de euros do plano de eficiência hídrica do Algarve, que são financiados através do PRR, uma parcela com significado é para reduzir as perdas de água na agricultura. Todas as utilizações agrícolas a promover a sul do rio Tejo têm de ser muito mais eficientes a gerir a água tanto naquilo que são as culturas que escolhem como obviamente na necessidade de rega que elas obrigam.

Não defende novas áreas de regadio, defende é uma otimização dos recursos hídricos naquelas que já existem?
A construção do Alqueva estava prevista para uma área de regadio muitíssimo superior àquela que já hoje está construída, e portanto nós aí é provavelmente o sítio onde temos água para poder expandir o regadio, o que não quer dizer que mesmo nessas áreas não tenha de haver uma muito maior eficiência do uso da água.

Essa preocupação que tem com o crescimento da área de regadio é partilhada pelo Ministério da Agricultura?
Cada vez mais.

Neste momento o que está em causa é uma utilização mais eficiente da água e não cortar recursos de fornecimento à agricultura de regadio ou campos de golfe?
A hierarquia de utilização da água é muito clara e está na lei. E a primeira prateleira dessa mesma hierarquia é o consumo humano, e eu nesses anos de seca nunca disse que não vai faltar agua, disse não vai faltar água nas torneiras dos portugueses, e conseguimos que isso nunca acontecesse e essa é sempre a primeira prioridade.

As equipas de Recolha de Resíduos Urbanos dos SIMAR foram reduzidas para metade mas a quantidade de lixo a recolher aumentou durante a situação epidemiológica da Covid-19, Loures, 30 de abril de 2020. (ACOMPANHA TEXTO DO DIA 02 MAIO 2020 .  MÁRIO CRUZ/LUSA

Matos Fernandes defende a subida da taxa de gestão de resíduos

MÁRIO CRUZ/LUSA

Resíduos: Algumas medidas foram revertidas no Parlamento “por quem quer sol na eira e chuva no nabal”

Nos resíduos têm surgido notícias negativas sobre o incumprimento de metas de reciclagem e tratamento de resíduos e reposição em aterro. A APA fez um relatório no ano passado que dá conta disso. De quem é que é a culpa das coisas estarem como estão e de não estarmos a cumprir as metas?
Com a pandemia era absolutamente impossível recuperarmos aquilo que eram as metas que já não estávamos a cumprir no que diz respeito à recolha seletiva. A grande aposta aqui está a ser e vai ser dos bioresíduos, isto é retirar de aterro a sua parcela mais significativa que é a da matéria orgânica. Até ao fim de 2023 têm de estar construídos, não há meta nenhuma ao contrário do que o dr. Rui Rio disse no discurso no congresso. Mas tem mesmo de ser retirada de aterro a quase totalidade.

É uma diretiva comunitária?
Sim que obriga a que até ao final de 2023 — mas não tem nenhuma meta, nem para 2023 há meta — o país tenha todo um sistema de recolha seletiva dos bioresíduos.

Vamos conseguir?
Vamos certamente conseguir. As autarquias são quem tem a responsabilidade da recolha. Eu não nego que gostaria que tivéssemos ido mais além. Não nego. Estamos de facto aquém das metas e com a pandemia não conseguimos — também não era de esperar outra forma — superar as metas a que estávamos obrigados. Agora há coisas que eu não consigo entender e que foram medidas no sentido certo e que foram revertidas no Parlamento.

Quais?
Uma delas é o aumento da TGR (taxa de gestão de resíduos). Andavam a dizer que Portugal era o caixote de lixo da Europa — recebíamos 1,6% dos resíduos que andavam a circular na Europa — porque a TGR em Portugal era muito baixa. Não era verdade. Seja como for, aumentámos com alguma expressão a TGR e logo o Parlamento disse nem pensar. Quando eu dizia no outro dia a um colega seu, que o Bloco de Esquerda tem os princípios certos, mas, quando se trata de uma solução, borrega sempre… aí mais uma vez borregou. A TGR aumentou para 40 euros a tonelada em Espanha, eu quero ver qual vai ser a pressão para trazer resíduos para Portugal porque a nossa taxa é mais baixa. E de facto ela tem mesmo de aumentar como forma de poder incentivar à recolha seletiva. A TGR é paga pelo que vai para aterro, tudo aquilo que era recolhido seletivamente e tem outro caminho paga zero de TGR. Portanto é absolutamente essencial que aumentemos a taxa de recolha seletiva, tem de ter um incentivo financeiro para que aconteça. Há cerca de 20 municípios do país que pagam zero pelos resíduos, que é uma coisa absolutamente inaceitável, um ato de egoísmo por parte dessas autarquias, mas sobretudo o que é essencial é termos um caminho equilibrado do ponto de vista económico-financeiro e algumas das medidas que tomámos, e tomámos bem, foram revertidas no Parlamento por quem quer sol na eira e chuva no nabal.

"O Bloco de Esquerda tem os princípios certos, mas, quando se trata de uma solução, borrega sempre... aí [na taxa de gestão dos resíduos] mais uma vez borregou."
João Pedro Matos Fernandes, ministro do Ambiente e da Ação Climática

Linha circular em Lisboa não volta atrás

A Câmara de Lisboa mudou de cor, e o atual presidente não concorda com a linha circular do metro, já o disse, já apelou ao seu repensar. Isto pode, de alguma forma, por em causa este projeto ou ele não volta já para trás?
Não volta para trás. É esquisito fazer uma obra contra a vontade de uma autarquia, para mim é uma coisa estranha, não é a minha maneira de fazer, mas quando uma obra está em curso, quando já foram feitos 400 metros de túnel, é óbvio que ela não volta para trás.

Portanto vai haver linha circular sem qualquer dúvida?
Vai haver circular. Está em construção, está em obra. Quando foi questionada no primeiro momento a linha circular foi com que objetivo? Era porque se considerava que era mais interessante fazer-se a linha vermelha. E porque as obras não se fazem no éter nem sem orçamento previamente definido, nós tínhamos, na altura, uma de duas alternativas: fazer a linha circular ou fazer a linha vermelha até Campo de Ourique, não havia dinheiro para a fazer até Alcântara. Sei bem quanto herdámos para financiar o metro de Lisboa e o metro do Porto do governo da direita: zero euros. Se não reprogramássemos o POSEUR não tínhamos feito obra nenhuma destas. Mas neste momento a linha vermelha vai ser feita — o estudo de impacte ambiental está entregue, são cerca de 310 milhões de euros para o seu financiamento, que estão no PTT. Já avançámos muito no projeto, com uma discussão muito intensa com a Câmara de Lisboa. Por causa do caneiro de Alcântara a estação de metro tem de ser à superfície, atravessa o vale de Alcântara em viaduto, que é uma coisa que eu preferia fazer enterrada, mas não há forma, precisamente para garantir o cumprimento de preços e de prazos e porque tinha um grande impacto no nível freático a montante. Assim, neste momento estão a ser feitas, uma mais avançada do que a outra, a linha circular e a expansão da linha vermelha até Alcântara. Não consigo entender a discussão de ser contra a linha circular, porque ainda ninguém conseguiu provar, nem vai conseguir, que esta tem menos passageiros que a outra.

Esta moção da Câmara esmorece aquela intenção de dar mais poderes às autarquias na gestão dos metros?
De todo em todo. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Como disse acho que era quase desleal num tempo de tão grande investimento que tem de ser feito no metro de Lisboa e no metro do Porto de entregar estas empresas às autarquias, mas que este é o caminho, este é o caminho.

Como a Transtejo e a Soflusa?
Como a Transtejo e a Soflusa que certamente o serão. Se aqui estivermos durante o próximo ano, certamente o serão até ao final do ano. Embora gostasse de esperar a chegada do primeiro dos 10 navios elétricos e que são a maior operação de transporte urbano e suburbano de passageiros por via fluvial no mundo movido a eletricidade.

Ponte sobre o Douro: ""num projeto de quatro anos, temos, neste momento, mês e meio de atraso"

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A contestação que houve no concurso da ponte sobre o Douro para o metro do Porto não vai atrasar muito o projeto, considera o ministro do Ambiente. “O atraso é muito pequeno em face daquilo que é a dimensão do próprio projeto. Houve reclamação de alguns concorrentes que preferiam ter ganho e não ganharam”, mas “é normal na vida de qualquer concurso”. Depois de invocar interesse público, para que o concurso não fosse suspenso, aguarda-se a decisão dos tribunais. “Mas estamos sinceramente convencidos da razão”. Matos Fernandes realça que “num projeto de quatro anos, temos, neste momento, mês e meio de atraso”.

 

Eleições à porta. “PSD não será, nunca, na minha opinião um primeiro parceiro para conversar”

Se o PS formar governo quer ficar como ministro? E do Ambiente?
É uma questão que não me coloco. Eu sou ministro há mais de seis anos, bati os recordes todos. Este é hoje um ministério muito grande. Eu sou um ministro muito realizado relativamente àquilo que fiz, muito insatisfeito quanto às muitas coisas que sei que há para fazer. Há dois anos preparei-me para uma legislatura de quatro anos e ela foi quebrada ao meio. Portanto o normal era não estarem a fazer-me esta pergunta.

Mas vê-se noutra pasta?
Vamos ter eleições que é aquilo que os portugueses não queriam que houvesse e vamos tê-las. Também sabemos que o que as provocou foi o chumbo do orçamento pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda. Portanto estou muito satisfeito com aquilo que faço e entendo também como muito natural deixar de ser ministro.

Nessas eleições concorre como número dois na lista do Porto.
Três.

Ainda mais ajuda. É um lugar elegível, mas ficou satisfeito com esse lugar?
Satisfeitíssimo, mas se fosse em quinto ficava satisfeitíssimo na mesma. Nunca faço essas contas para mim próprio. Há dois anos o número um era o Alexandre Quintanilha, o número dois o Rosário Gamboa, e eu era o numero três. Dois anos depois, com a queda do governo por razões que sabem quais foram, e que o governo nunca procurou e que o Partido Socialista nunca quis — obviamente nenhum governo quer deixar de ser governo e ir a eleições no meio de uma pandemia como esta — vamos a eleições e acredito firmemente que as vamos ganhar. Estou sinceramente convencido que as vamos ganhar e com resultado muito expressivo, portanto passados dois anos mantenho-me em terceiro lugar. Mas repito, se fosse em quinto o meu empenhamento era o mesmo. Não muda.

Está muito convencido que o PS vai ganhar as eleições. Mas efetivamente pode perdê-las. E se ficar em segunda lugar, António Costa já disse que tenciona sair da liderança do partido. Mas se ficar em primeiro lugar, mas sem maioria absoluta ou sem reforçar a posição que atualmente tem, acha que António Costa deve colocar o cargo à disposição dos militantes?
De todo em todo. Acredito firmemente que vai ganhar, é justo por aquilo que fez, muito particularmente em quatro anos em que a economia cresceu devolvendo rendimentos aos portugueses, e em dois anos terríveis de gerir, que foram estes dois anos da pandemia, e muito particularmente pelo projeto que o Partido Socialista tem para o futuro e que está escrito no seu programa. Se o PS ganhar as eleições naturalmente o dr. António Costa será desafiado a formar Governo e portanto era o que mais faltava que ele se demitisse, ganhando as eleições, nem conheço nenhum caso em que isso tivesse acontecido.

Mesmo que tenha um resultado igual ou pior ao que teve nas últimas legislativas?
Ganhar as eleições é ganhar as eleições. A vitória terá a dimensão que os portugueses nos quiserem dar. Também acho que a vitória não é para ele, é para nós que nos candidatamos em conjunto sob a liderança dele. Uma maioria absoluta permite ao PS governar durante quatro anos em condições — sempre de abertura para com todos os partidos — de governar de facto. Se não acontecer a maioria absoluta, veremos, com base em resultados concretos, com quem poderemos construir essa maioria estável. Mas é mesmo, mesmo desejável que essa maioria absoluta aconteça.

Entrevista ao ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Matos Fernandes. Lisboa, 12 de janeiro de 2022. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Quem seriam os parceiros em caso de não maioria absoluta?
Com quem é normal o PS entender-se já o provou. A geringonça durou seis anos e de repente alguém diz que parecia instável.. não me lembro de nenhum governo da direita, a não ser nas maiorias absolutas do prof. Cavaco Silva, mas aí não era coligação nenhuma, era só um partido no poder, ter durado mais tempo que isso. Nunca nenhuma coligação de direita durou seis anos. Portanto foi mesmo um governo estável e que nos permitiu, em conjunto, fazer mudanças relevantíssimas na vida dos portugueses. Há seis anos o PS nem ganhou as eleições e formou governo. Essas portas têm de estar sempre abertas, porque vamos acreditar que mesmo aqueles que provocaram esta crise política, que são o PCP e o Bloco, perceberão, em face dos resultados das eleições que aí vêm, que têm de ter uma postura diferente.

Continuam a ser parceiros confiáveis?
O que aconteceu foi grave, foi muito grave. E do lado do Bloco de Esquerda foi mais grave. Ainda não havia nenhum português vacinado contra uma pandemia que se sabia que ia ser terrível e chumbaram o orçamento, uma rutura completa da responsabilidade que um partido tem de ter para com os portugueses que representa. Não vou dizer que a situação é hoje a que era quando se formou a geringonça. Agora nós vamos ter de ter um governo estável liderado pelo PS de preferência com autosuficiência parlamentar. Se assim não for entre o PAN, o Livre e a nossa esquerda encontraremos certamente.

E com a direita não há qualquer opção de entendimento? Nem que se seja de viabilização de acordos parlamentares?
Eu recordo-me de muitas coisas que neste ministério foram aprovadas com a direita, com toda a naturalidade. Na chamada lei Uber, para os TVDE, o Bloco e o PCP pensavam o pior. E é óbvio que nós não podíamos permitir que medrasse nas sociedade e nas cidades um conjunto de veículos que prestava um serviço de grande utilidade às portuguesas e portugueses sem qualquer enquadramento nem para quem utilizava esses veículos nem para quem trabaalhava. Com quem é que neste ministério conseguimos a maioria necessária? Com o PSD e com o CDS. Portanto não tenho nenhum preconceito. Acho que é essencial que Portugal tenha uma política progressista, uma política de esquerda, de respeito pelas pessoas, uma política que não corte nada a ninguém, que não fale em austeridade. E o inverso disto é basicamente o programa do PSD e por isso mesmo o PSD não será, nunca, na minha opinião um primeiro parceiro para conversar.

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